30 August 2007

de onibus para Salvador


Começo aqui o relato da minha viagem pra Salvador para a Super-Exposição de meu querido Walter Smetak, relato este que vai abranger várias postagens.

Não só por causa do caos aéreo que tem se instalado no país, apagões, controladores de vôo, falta de atritos na pista etc etc (quem não tinha medo, passou a ter, e quem ja tinha medo.... viaja de ônibus!!!!), mas também porque a viagem por terra, lenta, prepara nossa mente e o nosso espírito para chegar junto. Precisava me preparar. Havia 29 anos que não ia a Salvador, perdi o contato com as pessoas que conhecia, muitos já não moram mais lá, os que estão na produção do evento conhecia só por email, e os filhos de Smetak eram crianças quando os visitei. 29 anos de hiato. Tudo muda em 29 anos. Mas o mais estranho: o meu Smetakinho não estará mais lá pra me receber...

No passado fui dezenas de vezes. Lembranças maravilhosas. Descobertas. Aventuras. Histórias loucas. Arembepe. Trio elétrico. Acampar no Jardim de Alá e em Piatã. E depois então que conheci Smetak, virou a minha cidade, me fiz soteropolitana, ia pra trabalhar com ele e acabava morando lá por meses e meses. Sem querer voltar. Foi por essas e outras que resolvi ir de ônibus pra Salvador. Pro meu espírito chegar junto.

Ora, quantas vezes no passado fiz esta mesma viagem... às vezes de carona até... às vezes em carros pequenos e cheios... por que não agora? Bem, minha primeira decepção foi constatar que não há mais ônibus-leito pra lá, mas só semi. Ah, tudo bem! pensei... só 27 horas: a gente embarca de manhã, dorme, e no dia seguinte está lá!!! Engraçado que esqueci de um pequeno detalhe: naquela época eu tinha 25, 30 anos, e agora tenho 60. Preparei toda animada o meu farnel de banana-passa, barrinhas de cereais, castanhas de cajú, frutas (nunca sabemos o que vamos encontrar nas paradas), umas roupas quentes pra noite, e- vamos lá!!! Minha segunda decepção foi chegar na rodoviária e ver que verdadeiras mudanças de muitas famílias estavam sendo enfiadas no bagageiro do ônibus, filas enormes com TVs, armários de roupas e otras cositas más... pesando, etiquetando... Claro que o ônibus saiu com um atraso de hora e meia... Mas a viagem foi agradável, as paisagens rolando soltas na janela. Como o Brasil é lindo, formações rochosas incríveis em cordilheiras, a vegetação -às vezes um pouco desmatado, mas outros lugares lindos (é muuuuuuito chão, gente!!). Até que escureceu. Distrair-se olhando pela janela já não dava. Ler os livros. Palavras cruzadas. Conversar com o Milton, que foi comigo. Várias horas depois, nada disso tinha mais graça. Paramos pra jantar em Governador Valadares.
Depois, só restava dormir. Tomei um frontal pra baixar o giro, e fiquei meio cochilante, mas com as curvas em velocidade que fazia o motorista, me jogando pra cá, me jogando pra lá, dormir mesmo nem pensar... Foi então que no comêço da madrugada um cheiro nauseabundo foi invadindo lentamente o ar que respirávamos. Cada vez mais nauseabundante. As janelas não abriam, havia um semi-ar-condicionado. Estávamos no meio do ônibus, mas o cheiro do banheiro, mesmo com a porta fechada, estava de matar. Nem cheguei a pisar os pés neste "aposento" durante a viagem toda. Deu pra esperar pelas paradas, que eram mais ou menos de 3 em 3 horas, dava pra aguentar... Mas a filosofia da grande maioria não era esta, cheguei a ver gente indo ao banheiro do ônibus com o ônibus parado!!!!! Ai, tava demais. Até que às 6 da manhã, em Vitória da Conquista (Bahia!!!! estamos na Bahia!!!!) entrou um funcionário pra limpar o recinto. De nada adiantou, ficou uma mistura do cheiro nauseabundo com desinfetante...

Ainda paramos pra almoçar em Jequié, sempre um inocente arroz branco, legumes cozidos... Garoava, estava lindo lá fora. Quando já era hora de chegar, o relógio acusando as 27 horas regulamentares para o fim da viagem, vi que ainda faltava muuuuito, nem tínhamos passado ainda por Feira de Santana, que fica a 2 horas de Salvador. Naquela cidade parou-se por um tempo enoooooorme. As mudanças saindo. Procura mala daqui, depois lá atrás, depois de novo lá na frente. Vimos nossas malas na plataforma várias vezes, Milton ia lá pra assegurar que iriam voltar... Bom, a viagem a Salvador de ônibus levou exatamente 30 horas!!!! Mas a alegria na hora de chegar me fez esquecer de fedor, fome, cansaço... Pegamos um táxi até o Centro, passando pelo estádio, as ruas entupidas de camisas brancas, vermelhas e azuis (Bahia) e vermelhas e pretas (Vitória), gente que não acabava mais. Dique de Tororó... que lindos aqueles orixás no meio da água...

Depois de chegar no hotel, tomar um banho gostooooooooooso, queria logo encontrar com o pessoal da produção, ir lá pro Solar do Unhão, mas precisava comer antes. Aonde? os lugares de 29 anos atrás simplesmente não existiam mais, tava tudo mudado, o Corredor da Vitória estava cheeio de prédios altíssimos, hotéis chiques... onde está aquela pousadinha em que me hospedei, e que ficava em frente ao ICBA, que agora se chama Instituto Goethe??? e aquele restaurantezinho barato, aquela minha amiga, baiana do acarajé que ficava em frente ao TCA??? Nada... me senti quase como chegando pela primeira vez... e já era noite, e... ESTAVA FAZENDO FRIO!!!!! será que estou mesmo em Salvador???

Sim sim sim. Campo Grande... quantas vezes andei por aqui, indo e vindo da UFBA, doces recordações... Um cansaço começou a me invadir em forma de torpor, anestesiando qualquer vontade de ver gente, falar, sentir, vibrar... precisava comer e dormir, nada mais. Achei um lugarzinho perto do hotel que servia tapioca (beiju) feito na hora, vários sabores. Foi a melhor tapioca que comi na vida: levava rodelas de tomate, cenourinha ralada e um queijinho minas. Bem quentinho.

Dormir dormir dormir gostoso. Não tem nada melhor na vida!!!!

E aqui o fim do primeiro relato, com a foto do nosso ônibus em forma de sombra no barro do chão, valentemente levando a gente pela estrada afora...

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