12 November 2009

não deu tempo...


Fui assistir THIS IS IT, o filme do que seria o último show de Michael Jackson, se não fosse a sua morte inesperada, 18 dias antes do primeiro show. Era pra ser uma série de 50 shows, que se realizariam entre julho de 2009 a março de 2010 no 02 Arena em Londres, com lotação esgotada meses antes: dois milhões de pessoas de todas as partes do mundo se inscreveram para a pré-venda de ingressos, e quando postos à venda, foram-se assim! os ingressos mais rapidamente vendidos da história, o público mais numeroso para um artista numa só cidade. O filme era pra ter sido uma coisa privada, somente para constar de seus arquivos pessoais, sem nenhum plano para divulgação de imagens. Acredito que ele não gostaria que estivéssemos vendo a obra ainda por fazer, seus drafts, mas com a tragédia, é um premio de consolação para nós, seus fãs do mundo inteiro, que jamais vamos vê-lo outra vez. Uma saudosa despedida.

O que é que a gente faz depois de um filme destes? como é que se engata o cotidiano, e segue-se adiante?

Quando o filme acabou, o cinema aplaudiu em peso. Fui a última a sair, assistindo aos créditos e a várias vinhetas-surpresa. Nem sei descrever direito o depois. Me levantei da poltrona literalmente tonta, e vi que todos já tinham ido embora. Queria ver de novo. Saí trôjda, zonza, andando em zig-zag. Trôpega em pleno Largo do Machado, e... o que fazer? pra onde ir? me arrependi de não ter assistido a mais uma sessão logo em seguida. Tava querendo mais. Mas ao invés disto, comprei um sorvete, e vim tomando pelo caminho, neste dia de tanto calor, andando e pensando e sentindo, sentindo e pensando e andando...

Ver o Michael tão vivo ali, tão presente, tão ativo, tão intenso (apesar de dizer que estava querendo se poupar, ele se entrega inteiro, sob aplausos de todos que o estão assistindo) é um choque, porque é a imagem de uma coisa que era pra acontecer, mas não deu tempo. Um filme de uma despedida em que os protagonistas não sabiam se tratar de tal... Muito difícil e muito doloroso acreditar que ele não está mais aqui, que este show não rolou nem vai rolar... nem este, nem outro nunca mais (nunca diga a palavra nunca, mas neste caso, é nunca mesmo!). Difícil pelo absurdo da situação: saber que não temos mais o que vemos ali em plena forma (apesar de não ter feito show há anos), inteiraço (apesar das notícias nefastas de cadeira de rodas, máscaras, remédios, vida conturbada, atitudes grotescas, escândalos de pedofilia jamais comprovados). Fisica e psicologicamente inteiraço, comandando, sabendo exatamente o que quer (“essa nota não!”), dançando com uma precisão de acrobata chines, cantando divinamente, dirigindo os músicos, fazendo os arranjos, corrigindo a coreografia (“esse dançarino deveria sair antes”), dirigindo o show inteiro junto com Ortega. E de uma maneira inteiramente encantadora, doce e gentil. Gentileza para com os colegas e vice-versa, distribuindo sorrisos cativantes, mostrando humildade ao admitir deslizes (sorry!). Coisa rara, em se tratando de estrelas de primeira grandeza, que nem sempre mostram este cuidado. Uma pessoa especial.

Não quero tirar a surpresa de quem ainda não viu. Só digo que é imperdível. Não é preciso nem falar aqui -mas falo- de todo o extraordinário elenco de artistas envolvidos no projeto, desde o diretor Kenny Ortega, que consulta MJ a cada momento, aos dançarinos "invertebrados" e feitos de látex, ao time monumental dos músicos, aos cenários e efeitos especiais high-tech, 3D, MJ no bar assistindo Rita Hayworth cantando, Humphrey Bogart caçando-o de metralhadora, enfim... o maior show de todos os tempos, e como MJ diz: “quero que o show leve as pessoas a lugares onde nunca foram, e impressione como nenhum outro já visto”. Pode crer que era isso que iria acontecer. Menciono ainda tres mulheres simplesmente inacreditáveis: a Mekia Cox, uma negra inteiramente fantástica de uns dois metros de perna, com uma andada e uma cara pra lá de deliciosas, que dança com ele em This Is The Way You Make Me Feel; a Judith Hill (americana de mãe pianista japonesa e pai músico negro de funk), backing-vocal que faz duo com ele em I Just Can’t Stop Loving You e a louca guitarrista inenarrável Orianthi Panagaris- que nome!- (australiana, descendente de gregos), que, alucinada, segue-o no palco em diversos números e toca absurdamente.

É comovente ver como Michael é amado e respeitado pelo elenco (“estamos aqui por ele, e que ele continue nos guiando no caminho”), e vice-versa. Família.

Uma parte é dedicada ao Jackson 5, e MJ cita o nome de cada um deles, dizendo, emocionado, que os ama. A gente assistindo assim, começa a chorar... Uma hora em que me lembrei de Jimi Hendrix (acho que foi uma citação proposital) quando MJ joga o paletó no palco, queima-o (Jimi queimou a guitarra) e ele se ajoelha ao lado do casaco queimando (no ensaio, é só a marcação), e faz aqueles movimentos do Jimi com as mãos imitando labaredas.

O filme é dedicado aos seus tres filhos: Michael Jr (Prince), Paris-Michael e Prince Michael (Blanket). No final, outra cena "forte", de molhar os lenços: uma roda com todos os participantes, Michael agradece a presença, a energia, o trabalho, a união, a dedicação de todos. A gente sente a energia intensa que circula naquele momento, agradece e sai do cinema com lágrimas.

É pra ver várias vezes, com a certeza dolorosa de que perdemos o maior artista de todos os tempos.