31 December 2007

feliz ano novo


Último dia do ano.

Como foi o ano que está se despedindo? primeiro, passou que nem vi... me lembro de março, depois agosto, e agora dezembro. E segundo, aconteceram coisas que jamais esperaria. Boas e ruins. As boas foram maravilhosas- aquarela, viagem com Su a Natal, Exposição de Smetak em Salvador- e as ruins... bem, as ruins foram péssimas. Pressão alta no começo do ano e rompimento com irmãos no segundo semestre. Foi isto que me fez calar. Tive que reaprender. Me reestruturar. Reavaliar. Recomeçar. Reanalizar. Relembrar. Regorgitar. Renascer. É disso que se tratam os cabelos brancos, as rugas, mas também a experiência e o auto-conhecimento. Ainda estou sob o efeito da pedra do destino que bateu na minha cabeça. Zonza. Zonza e só, mas viva. Subtraindo aqui, somando ali, posso dizer no mínimo que foi um ano de crises existenciais, que trazem revoluções e mudanças profundas. Mas cara, num guento mais crises e cruzes ....

E pro ano novo, o que desejar?
SEJAMOS REALISTAS. EM 2008 VAMOS PEDIR O IMPOSSÍVEL!!!!!

08 December 2007

8 dezembro


Um dia triste pra mim. Faz 19 anos que mamãe se foi. No mesmo dia também morreram Lennon e Jobim.

Ei-la antes de eu nascer.

07 December 2007

inteligencia dos chimpanzes


Realmente estou fora do ar blogueiro nestes dias semanas meses, mas tenho motivos, tem outras coisas. Grandes rompimentos familiares me fizeram (fazem) adernar, e até meu barquinho sair deste mar revolto, leva tempo. Pra poeira abaixar, novas realidades serem apreendidas e sedmentadas, enfrentar todo tipo de sentimento, desde os mais obscuros gritos vindos das entranhas do ser, até o mais leve sussurar de lembranças doces que guardo com afeto. É normal, e é assim mesmo, as coisas demoram, mas no final a gente chega lá. Isto é vida, isto é crescimento, isto é difícil, isto é inevitável se você quiser evoluir pra melhor. Dói, mas depois deixa a gente mais forte.

Não é que eu esteja inerte não!!! pelo contrário, tenho me sentido, até mais do que antes, viva, pulsante, atenta, ativa, antenada e disperta, apenas não consigo escrever, verbalizar o dilúvio. E como as curiosidades do mundo me fascinam, quero registrar aqui um artigo interessantíssimo que saiu nos jornais esta semana: chimpanzés superam universitários em teste de memória (BBC, 4 de dezembro). A pesquisa foi feita em Kyoto no Japão.

Foram testados 3 pares de chimpanzés cada formado por uma mãe e seu filho, contra estudantes universitários em um teste de memória que envolvia números. Estas mães chimpanzés e seus filhos de cinco anos já tinham aprendido como contar de um a nove. A experiência consistia foi assim: cada participante viu em um monitor vários números de um a nove. Estes então eram substituídos por quadrados em branco e o estudante ou o chimpanzé tinham que lembrar qual número apareceu em qual lugar, e então tocar o quadrado certo na tela. A surpresa foi que os chimpanzés jovens tiveram desempenho bem mais veloz e preciso do que suas mães e do que os universitários. Acontece que nós, seres humanos, percorremos a tela com movimentos dos olhos,o tempo todo durante uma leitura, e a mente dos chimpanzés "fotografa" a tela, memorizando-a instantaneamente.

Não é incrível? nossos parentes mais próximos estão muito mais próximos do que a gente imagina. Pensa bem, imagina em quantas tarefas, trabalhos, profissões eles poderão nos ajudar. Colaborar. Substituir. Opa!!! lá vem o Planeta dos Macacos, e não é filme nem ficcão!!!!!

Pra comemorar, vou chamar o Jorge Mautner aqui pra cantar o Samba dos Animais:

o homem antigamente falava
com o cobra jabuti e o leão
olha o macaco na selva
não é macaco
é meu irmão
porém durou pouquíssimo tempo
essa incrível curtição
pois o homem rei do planeta
logo fez sua careta e começou a sua civilização

agora já é tarde
ninguém nunca volta jamais
o jeito é tomar um foguete
é comer deste banquete
para obter a paz
que a gente tinha quando falava com os animais

21 November 2007

... e uma abobora


Uma abóbora moranga, gostei principalmente da mancha na casca, era assim mesmo. Depois abrimos e comemos a dita-cuja recheada ao forno mmmmmmm.....

flores e passaros em aquarela



Estas aí de cima são desta semana, e as de baixo são de uns meses atrás, esboços-rascunhos que ficaram bonitos.

20 November 2007

Dia da Consciencia Negra


Assim como no ano passado, Abdias aparece aqui e mais: em companhia de Léa Garcia, que merece também todo tipo de homenagem neste dia. A foto é dela com o Abdias, como Ifigênia e Emmanuel na peça Sortilégio: Mistério Negro, de Abdias Nascimento. Rio de Janeiro, Teatro Municipal, 1957. Peça encenada pelo Teatro Experimental do Negro (TEN), fundado por Abdias. VIVA ELES!!!!!

louca em aquarela





Abrindo a cristaleira de casa, os armários, vou pescando umas louças bacanas pra por no papel.

16 November 2007

gatos em aquarela


SEMÍNIMA NA CESTA ENCIMA DA GELADEIRA

GONG-LI E COQUINHO NA ESCADA NO QUINTAL

15 November 2007

aquarela


Agora no momento o que mais estou curtindo é pintar aquarela. To há 5 meses tendo aula com a Verônica, e tá sendo demais. Pintar com água é que nem fazer improviso em música: a gente nunca sabe como vai sair. A água vai fluindo, é imprevisível e incontrolável, e as técnicas não se aprendem em uma aula. Dizem que a aquarela é a modalidade mais difícil na pintura, acredito mesmo. E tem que saber desenhar bem, senão fica meio esquisito. Engraçado que quando vejo ela Verônica pintando, parece tão fácil, aí vou fazer igual, e sai diferente, às vezes diferentíssimo, um borrão só. Mas ela mesmo diz que não consegue fazer duas pinturas iguais. Não é emocionante??? Uma verdadeira viagem sem saber aonde vai chegar. E adoro misturar cores pra fazer outras, tem algo muito sensual naquela melação toda. E relaxa, freiando a minha ansiedade louca, a minha impaciência, o meu tremor interno desenfreado, preenchendo a minha solidão, antigamente tão evitada, hoje tão preciosa e necessária pra minha cabeça, rins e fígado!!! A ponto que se eu não a tiver, a invento.

Sempre me amarrei em desenhar, pintar... Na faculdade de arquitetura era o que eu mais gostava. O tempo foi passando e fui me dedicando a outras coisas, leia-se música. E esqueci que gostava de desenhar. Às vezes rabiscava aqui, esboçava ali, mas nada dedicado. Se a gente gosta, a gente se dedica. Mas nem sempre. Penso que teria sido bom se tivesse começado há uns 10, 15 anos atrás. Mas cara! aonde estava eu nesta época? viajando em que galáxia? É uma bobagem pensar assim, uma emoção inútil. Não foi antes porque não era a hora. Ainda bem que acabei começando um dia.

Uma vida é pouco demais pra fazer tudo que a gente gosta: pintar, cantar, pandeiro, piano, cavaquinho, dançar.

Eis aqui umas antigas: minhas primeiras bananas e mamão, minha primeira louça com formas variadas, e meus primeiros moranguinhos e a toalha bordada. Vou colocar mais.

28 October 2007

primavera


Ela chegou há pouco mais de um mes, e está no auge de sua beleza, trazendo estiagem, seguida de chuvas violentas. E calorzinho que faz lembrar que daqui a pouco estarei me derretendo nos 40 e poucos graus do verão carioca. Mas por enquanto, não quero pensar em coisa ruim. Por onde passo, as flores estão pipocando, explodindo.

Estas que estão na foto são os bouganvilles que plantei no canteirinho atrás de casa. Deram tão certo -apesar do fato de terem sido plantados em canteiro- mas cresceram tanto tanto, que tomaram conta do varal.

Aí tem na verdade quatro cores, apesar de eu ter só plantado três: maravilha, pêssego e coral. Acontece que o coral nasce rosa, então... fico um tempão contemplando, apreciando, e fico orgulhosa: fui eu que plantei. Bom pra quando se está triste, é só ir lá atrás, olhar pra cima e levitar. E cantar...

Primavera. E neste instante me lembro da música do Cassiano com este título, e que virou sucesso na voz de Tim Maia. Gosto muito desta gravação, mas a que mais me arrepia é a do próprio autor, uáu! a sua interpretação é o máximo, não deixe de escutar. A letra é de uma singeleza só, olha só... é uma das músicas mais lindas que conheço. Soul puro.

quando o inverno chegar
eu quero estar junto a ti
pode o outono voltar
eu quero estar junto a ti
porque
é primavera
te amo
é primavera
te amo
meu amor

trago esta rosa
para lhe dar
trago esta rosa
para lhe dar
trago esta rosa
para lhe dar
meu amor...

Sensível do jeito que tô, fico com lágrimas nos olhos...

26 October 2007

um olhar


Este olhar que cê tá vendo aí é da Emilinha, Poderia ser o meu. Nenhuma foto explica melhor o que estou sentindo neste momento. Pode parecer que tem tristeza, tem também, mas não é só. É um olhar profundo. O meu, além de tristeza e profundidade, tá perplexo. Tão perplexa estou, que não consigo estar inteiramente presente nas coisas que tenho que fazer. Tem um pedaço que tá perplexo e parado olhando um ponto fixo distante, e não vendo nada. Penso. De manhã à noite, penso. Mas penso nesta coisa só, neste nó no meu presente, neste vácuo no meu passado. Pensar pra entender, chegar mais perto do que poderia ser uma compreensão. Mas é difícil compreender alguma coisa com tantos sentimentos antagônicos embaralhando tudo. É difícil compreender alguma coisa quando não se entende nada. Cada dia penso o contrário... e enquanto estiverem voando lembranças palavras corações flechas e fígados num rodamoinho violento perfurando meu cérebro, não posso me mexer, além de pra dentro. Nada decidir numa hora destas.

Mas eu entendo sim. Acho que entendo. Não tudo. Haja coragem pra entender! Entender, virar a página e ir em frente... Emilinha, me ensina please!

15 October 2007

... e tantos mais...


... e tantos mais são as Plásticas Sonoras de Walter Smetak. Poderia ficar o ano inteiro falando disto. Mas vamos ficar por aqui, esperando que a exposição venha para o Rio. Aqui vão mais uns instrumentos. A da foto de cima é o Beija-Flor.
FECUNDAÇÃO CÓSMICA


IMPREVISTO


METÁSTESE


MIMENTO


MIRCUR


PÁSSARO MAMÍFERO


QUEBRA-GALHO


VIOLA DA GAMBA


E ainda:
Namorados Abstratos
Reta na Curva
Piston Cretino
Mulher Faladora, movida pelo vento
Chicote
Violão Eólico
Aranha
Constelação
Peixe
Vau
Vir a Ser
Olho Público

E tem mais... mas como eu disse, vamos ficar por aqui. Como disse Smetak, "falar sobre a música é uma besteira; executá-la, uma loucura". Encerro este post com um poema seu, que está no livro A Simbologia dos Instrumentos. Axé e até!

PLÁSTICAS SONORAS
Sinto estes corpos milenares
com mil pregos furados em tábuas
igual aos cristos nos calvários

coladas as costuras e emendas
tapadas com os dedos nove fendas
para segurar as folhas tremendas

e se decompondo em fragmentos
num buquê de flores e legendas
em ritmos lentos aos quatro ventos

13 October 2007

o Pindorama


Toquei neste muito também, quando participei do Laboratório de Criação Espontânea em 76 no Solar do Unhão. Mas só tem graça se tem mais de 20 pessoas. É uma viagem sonora-sensorial inenarrável!

"De 1973, instrumento musical de sopro e percussão, feito de cabaças, tubos de plásticos, bambu, cano de pvc, madeira e metal, com altura de 2,20 m. Instrumento coletivo, contendo no meio o sextante, instrumento dos navegantes, anterior à bússola. A cabaça central, usada com boré (boré- uma família de instrumentos de sopro de Smetak, feitos de tubos de poliéster, com uma cabaça para a saída do som, e um bocal aberto, que dá bramidos, típicos dos índios, para a chamada da guerra), significa uma projeção em 6 direções, ou seja: norte, sul, leste, oeste, nadir e zênite.

Uma corda, em volta horizontal e vertical, dá a possibilidade do contraste sonoro entre uma série de flautas harmônicas, uma série de chocalhos. O seu aspecto exterior monstruoso, de uma ameba em constante divisão e desdobramento, dá a possibilidade de 60 pessoas se ativarem musicalmente" (do livro de Smetak, A Simbologia dos Instrumentos).

08 October 2007

o Bisnadinha


De 1969, plástica sonora feita de arame, madeira, metal, papel e fio de plástico, com 60 cm de altura.

Este é o mais comovente das criaturas. É o próprio João Ninguém de Noel, o Nowhere Man dos Beatles, e podemos, cada um de nós, nos identificar com este serzinho niilista nos momentos down de nossa vida, em que nos achamos um zero. Contundente, horripilante, expressionista, real e profundo.

Do livro de Smetak, a Simbologia dos Instrumentos, um dos textos mais poéticos, na minha opinião. : "Torna-se realmente difícil escrever uma biografia sobre um serzinho que se tornou o Nadinha, já repetidas vezes. Escapa à nossa percepção, entretanto ele está aqui, entre nós, mexendo os pauzinhos. Valor, sem valor e validade, inconsciente como uma molécula de matéria despejada do imenso forno do universo. Nasceu de uma chama de vela que um amigo colocou em suas mãos frias, como última dádiva para o longo caminho da morte. Junto, uma rosa vermelha, enfeitando a morte. Porque o Bis-Nadinha, durante a sua vida que terminou de repente, sempre foi um sujeito alegre e dotado de certa filosofia. Julgava-se sem liderança, convencido de sua absoluta nulidade, e usava com abundância os perfumes da natureza. Fez o dia de noite, e a noite de dia. Era, e ainda é, um Beatle, se é permitido dizer tal coisa quanto à mais abusada dualidade. E se dá bem nesses termos, como assegura repetidas vezes. Não quer outra vida. Eis a forma magnífica da sua existência. Continua fielmente a ser aquilo que não era (!). Eis a sua tragédia. Sente nas costas o fixo-móvel do espírito invulgar coletivo, mas sem poder dar a moldura de uma personalidade constante e amadurecida. Esforça-se para enquadrar-se na vida. para este fim, suportou dezenas de exames e testes, e traz o selo da borboleta na testa, simbolismo do tradicional laço de seda que a mãe coloca nos cabelos das meninas...

Passaporte para nova vaga da vida.

A sua saudade é profunda, encontrando-se num grande vale vertiginoso. o que está em cima agora está embaixo, e vice-versa, como se a inteligência da percepção das coisas fosse nos pés, e a cabeça andando. Os olhos procuram um caminho neste labirinto de xadrez preto e branco. Mas não o acham. Estão olhando de fora para dentro, e enxergam apenas uma folha verde que ocupa o espaço onde normalmente se escondem os miolos.

Quo Vadis? Para onde eu vou, suspira o ponto de interrogação que sai como fumaça do cigarro, da sua boca sem boca. Eis aqui o seu fantasma. Estará vivo ou morto? Um vivo-morto, um morto-vivo?

Somos nós ele, ou está sendo ele nós?

Bis-Nadinha, um fantasma; em vida, era um grande farrista, morreu muito cedo e está aqui dependendo de duas coisas: vemos, na frente, uma elipse e, atrás, um quadrado, isto é, ele está fazendo um grande esforço para reconhecer seus erros e quer se enquadrar novamente como pessoa viva... Fica na dependência de sua alma... procurando uma nova personalidade.

Mostra, ainda, sua juventude com uma perfeita dentadura. Botou uma rosa no cabelo e lembra um pouco as criaturas de hoje, os cabeludos.

Tem um som tétrico.

Bis acaba de repetir... repetir o nadinha.

Seu sustentáculo é uma cravelha. Tem um lacinho na cabeça, símbolo do infinito, um oito".

SALVE O NOSSO HERÓI!!!!

06 October 2007

o Coloquio


Adoro este também. Estas duas cabeças esculpidas em barro por Smetak são tão expressivas (além de tudo, um escultor!!!!), e quando a gente toca nas cordas, elas tremem, se mexem, dando vida a este diálogo.

Do livro de Smetak, "A Simbologia dos Instrumentos": "Montado em dois vergalhões de ferro que se cruzam, as duas potestades da dualidade milenária, formando a letra X, simbolismo do tempo. Vemos os dois Brasis: aquele que funciona com a explosão da gasolina, do ouro negro, e aquele outro Brasil, encostado como um fac-símile no seu irmão, reservatório "sui generis"de tudo, conhecido e desconhecido em matéria de comparação. O Distrito Federal, meio século mais tarde, denominará este quadrado de terras encravado no estado de Goiás, vizinho de Mato Grosso e do Amazonas, com outro nome : Federação Divina. E toda a riqueza espiritual que este irmão desconhecido possui será derramada sobre o mundo, que se salvará das ruínas.

O colóquio tem 7 cordas, no meio, uma cruz. No meio do X, coloquei um ponto vermelho e dourado, mostrando o fogo sagrado.

O som dele é muito solto, treme".

30 September 2007

a Arvore


Quando conheci o Smetak no curso que ele deu em 76 no MAM RJ, ele havia trazido váríos instrumentos seus, e fez apenas um aqui no Rio: a Árvore, réplica imensa desta pequena da foto, que ficou em Salvador. Quando acabou o curso, ele me deu o instrumento, que aliás, está perdeu sua cabaça (60 a 70 cm de diâmetro), comida pelas traças, e estou procurando outra pelo Brasil todo, mas até agora, não encontrei ainda deste tamanhão (quem souber, me avise). Adoro este instrumento, Pode-se tocá-lo percutindo, ou friccionando suas cordas, que são de piano. A base do meu é um chanco enorme de um tronco de uma árvore, é tão pesado, que precisa de 6 pessoas pra carregar, mesmo assim é difícil, porque não tem lugar pra segurar direito por causa dos ferros.

Mas vamos ao livro "Simbologia dos Instrumentos", de Smetak: "Na beirinha, esta árvore foi pintada de amarelo, cor da intuição. Verde: cor do mental concreto. Embaixo, o tronco de madeira é verde, com a cavação vermelha.

Este instrumento leva a nossa subordinação pessoal para leis superiores à nossa percepção da razão. Introduz o conceito de Caos, mas num sentido de ordem superior, fazendo a ligação imediata e imprevista, porém benéfica e justa.

Na África, os indígenas têm um sistema de instrumentos naturais para transmitir suas mensagens de uma aldeia para aldeia, no qual é usado um funil. Cavam um buraco dentro da terra, e colocam uma corda que atravessa no ar eeste funil; põem a corda em vibração e, tocando esta corda, o som é levado para grandes distâncias. Trata-se de um código que alguém lê, ouve e transmite, uma espécie de telégrafo.

Ao sentarmos embaixo de uma árvore, podemos ficar inspirados, podemos perceber e sentir coisas muito ricas da natureza, a geometrização da forma da árvore...

(...)Mas, por que me contam isso, perguntará o leitor? Direi: por ser aquilo que chamam de música, muito simples, simples demais, porque quase incompreensível para nós. Vem do reino das fadas e das lendas, que para alguns é a realidade. Tudo tem vida, tudo toma parte como uma gota no grande oceano da Vida-Una. Tudo é respeitado, da folha caída de uma árvore até a pedrinha no riacho; há tantas que não se vê uma solitária, separada das outras. Nada é mais, nada é absolutamente maior ou menor- mas o homem tem a maior possibilidade de todos os seres vivos, ele é o ser regente. Ele até tem o dever de falar com os aparentemente menores, insignificantes, para lhes ensinar, ensinando sempre. A natureza, manifestada ou não, em volta, está angustiosa para saber; ela também quer evoluir, libertar-se, para continuar a sua evolução infinita. Se um instrumento for composto de partículas de todos os reinos da natureza, o homem, consciente de tudo isso, se faz de Guru, mestre e regente. Ele se identifica com todos os seres, digo, com todos esses irmãos menores que se acham quase como perdidos. Ele se une a todos.

E num "raga" incompreensível, ele conta a história de milênios, milésios ou "mil-asianas". Daí vem a magia, porque houve homens conhecedores das forças da natureza para manobrá-las. Ele, o homem, nos cantou a terra, esta terra maravilhosa, a bola dos deuses, viajando há eternidades no éter azul. Ele representou o microcosmo dentro de um "raga"com toda a natureza em volta. O estado de consciência no qual se encontrava, o oriental o chamava de "Avatara" (ave-asas, tara-transpassar). Avatarizando-se nos reinos inferiores, e mais ainda, nos reinos superiores. Chamamos isso de inspiração, mas não sabemos de onde vem, e poucos sabem para onde vai... O instrumento torna-se um grande cetro; e ele era um Rei... e agora um mendigo.

Compreendemos agora a citação do poeta Maiakowski: "Hoje tocarei flauta na minha própria coluna vertebral". Este autor moderno parece a reminiscência de um velho mago tibetano, tocando uma escala musical num fêmur humano, acompanhando o seu próprio corpo defunto para a cova, porque ninguém quis assistí-lo ou também porque não precisava de ninguém. Maiakowski= Maya cova= túmulo da ilusão. Aquele que venceu a mnorte... ou pela segunda veza nascido e flautando sempre..."

21 September 2007

a Ronda


Esta também é uma das minhas preferidas. Ela tem um som maravilhoso, e me lembro de Smetak me dizendo: "se você roda a manivela devagar, e tange as cordas com o arco, aí está o rítmo. Se gira um pouco mais rápido, a melodia. E muuuuito rápido então, é a harmonia". Ou seja, rítmo melodia e harmonia só diferem pela velocidade. Muito doido.

De 1969, a RONDA é um instrumento friccionado e pizzicato, de madeira, metal, cabaça e ferro, de 96 cm de altura.

Do livro de Walter Smetak, A Simbologia dos Instrumentos: "Instrumento cinético que me deu muitas conclusões pela sua materialização. Quando ficou pronto, fiquei sabendo de coisas que antes não sabia. Vemos aqui mais ou menos a forma da ampulheta do tempo. Se isto já está ligado ao tempo, também deve estar ligado ao movimento e ao espaço, pois existe esta fórmula matemática que a ciência associou tantas vezes: movimento-tempo-espaço.

Este instrumento se dedica à duração do som, isto é muito importante. Tem 22 cordas estendidas em volta, às vezes falta uma corda, todas não são regulares, é como uma boca onde faltam dentes.

Duas cabaças encaixadas uma na outra, muito primitivo. Tem duas rodas de madeira, com pregos, onde a corda fica estendida, e duas cravelhas.

É afinada como quiser. Pode ser tocada com arco e pizzicato.

Um carrossel emitindo sons. Sendo que a escala é composta de uma sequência das séries harmônicas, este instrumento traz uma nova experiência.

No giro lento isso dá um ritmo. Tem intervalação. Numa velocidade maior, o instrumento não deixa perceber os intervalos, formando uma linha melódica. Numa velocidade maior ainda, ouiremos só harmonias, porque o giro é tão rápido que ouvimos muitas cordas em uma só vez.

Concluímos, então, que o ritmo, a melodia e a harmonia dependem da velocidade de giro. São tres coisas em uma só, que dependem da velocidade.

É preciso dar tempo ao tempo, diz o adágio popular...

Está na nossa frente a ampulheta, o relógio do tempo, no qual o mesmo se esgota. Areias de desertos, areias sem fim, mares de areias.

Dizem os árabes: Os homens temem o tempo, mas as pirâmides e a esfinge sustentam o tempo...

O que vale neste instrumento é o silêncio que segue o turbilhão de sons, o profundo silêncio no qual a nota, a vibração, se encontra com si própria. A união de todos no Todo.

Existe uma analogia entre este instrumento e o "Imprevisto", embora pertença aos instrumentos de percussão. A diversidade dos sons forma, no seu conjunto de ecos, uma unidade. isto é, em vários instrumentos desta natureza, constitui um ritual de digno e específico poder de criação. Seu simpolismo é evidente. Identificamos, com clareza, o número 8, o eterno vir a ser, na complexidade de seruu mistério. Reconhecemos a forma do violino, ou alguma composição primordial, que poderia ter dado forma ao violino, cujo nome lembra, filologicamente, a Vina.

Vemos, assim, m oito, símbolo do som e do infinito, girando num eixo, como se fosse uma vitgrola, palavra esta deivada de uma outra -vitriol..."

a Maquina do Silencio


Esta me lembra das invenções de Leonardo da Vinci. Plástica sonora de Walter Smetak, instrumento manual, mecânico e elétrico, feito de madeira, metal, cabaça, isopor, fio e fibra, altura: 1,71 m, 1971.

"Máquina do Silêncio: um absurdo, por que não? O silêncio, considerado ausência do som, não é sempre aplicável, referindo-se a situações interiores de estados psíquicos. Movimentos mecânicos ilustram diversos atritos eletronicamente amplificados, como podem ser ouvidos interiormente os elétrons em volta do núcleo: o átomo permanente. Em cima, uma roda friccionando uma faixa de cordas em diversas afinações no meio do cilindro" (do livro A Simbologia dos Instrumentos, de Walter Smetak).

o Sao Jorge Tibetano



Plástica Sonora de Walter Smetak, feita de cabvaça, metal, madeira, disco vinil, franja de tecido, altura: 55 cm, 1969.

"Para melhor entendimento pelo público ocidental, foi criado este Ser, mais conhecido pelo nome de São Jorge; em verdade, o Cavaleiro das Idades, venerado no Tibete como "Ak-Dorge"e "Buda Maytréa". Ele tem por função destruir o mal, para triunfar o bem, e fazer desaparecer o "não"categórico, para a glória do sim, destruindo as velhas dualidades"(do livro A Simbologia dos Instrumentos, de Walter Smetak).

o Guerreiro


O GUERREIRO, plástica sonora de Walter Smetak, de cabaça, metaql, madeira, côco, cano de plástico, fio de plástico, altura: 1,15m, 1969.

"É o músico guerreiro, disposto a tocar ou matar. Tem a alegoria da flecha apontando o céu, uma flecha jogada assim no infinito. Aquela flecha podia ser solta se aquilo que está embaixo estivesse igual àquilo que está em cima. Ou seja, o perfeito equilíbrio entre o subjetivo e o objetivo: seria quase o fim da evolução" (do livro A Simbologia dos Instrumentos, de Walter Smetak).

o M-2005


Plástica Sonora de Walter Smetak, o M-2005 é um instrumento musical de corda percutida, feita de cabaça, metal, madeira, isopor e plástico, de altura 2,25 m, 1969.

Do livro "Simbologia dos Instrumentos", de Smetak: "O percussionista é a oposição do regente, sendo o seu inverso; serve-se do bloco de gelo como se este fosse o instrumento de percussão e, ao mesmo tempo, de um prato pendurado no tronco da árvore.

Em contradição com esta atmosfera glacial, fica o leque. Ele sente apenas chegar o calor e sente-se literalmente quente. Abanando-se, ajuda o degelo do bloco, e não percebe mais, distante como ele é, verdadeiros fatos, o sopro do regente de cima, que anima a todos.

A linguagem desta escultura é universal e dever ser entendida nos próximos tempos. Só assim o público entenderá os acontecimentos que virão. O isopor expressa formas congeladas.

O instrumento de frente indica que a flecha está sendo atirada para o abstrato.

Deste instrumento sai um som reproduzindo a sílaba sagrada OM".

o Anjo Soprador


Plástica Sonora de Walter Smetak, o ANJO SOPRADOR é um instrumento musical de sopro, feito de cabaça, metal, madeira e plástico, de 55 cm de altura, 1969 (ver post SMETAK IMPREVISTO de primeiro de setembro).

Adoro suas orelhas estridentes: dois agogôs que são do formato dos símbolos crescendo (<) e decrescendo (>) das partituras, da matemática, uma tremenda sacação da parte do autor. O movimento dos braços é perfeito e sua cara de traços simples, tocando compenetrada, é muito expressiva.

Do livro "Simbologia dos Instrumentos", de Smetak: "O Anjo Soprador tem duas cabaças, uma em cima, crânio e, embaixo da máscara, outra cabaça que é reflexo, como se estivesse refletindo numa lagoa. A flecha que atravessa o crânio é um crescendo.. ou descrescendo, o som vai e vem, como se quisesse mostrar o ser que se vê como reflexo de si próprio".

17 September 2007

o Amem


Plástica Sonora intitulada AMÉM, de Walter Smetak, exposição SMETAK IMPREVISTO (ver post do dia primeiro de setembro). Feito de madeira, metal, cabaça e cordão, altura 74 cms, 1969.
Esta foto é mágica! Este raio de luz conectando-se com o Amém ficou incrível, e foi por acaso (fui eu que tirei a foto). Parece Deus. Deixa eu explicar: quando eu era pequena, a "foto" de Deus era um raio de luz pra mim. Em qualquer livro em que eu via esse raio de luz, na maioria das vezes vindo por entre as nuvens no céu, era a imagem de Deus. Agora Ele aparece aqui. E logo no Amém!!!!

Abro o livro de Smetak "A Simbologia dos Instrumentos": "Amém, isto é, seja feito. No Amém, podemos ouvir o sonido transcendental da palavra sagrada OM, o AUM. A palavra sagrada é uma vibração síntese que fecunda as mentes.

Aqui, no extremo Ocidente, a palavra tem o nome de Amém. Ouvireis e vereis com ouvidos e olhos fechados. Ela aparecerá em letras de outro num fundo de púrpura, e será sempre inesquecível. Aquilo será, daí por diante, a vossa grande felicidade. Porém essa felicidade só pode nascer de um profundo silêncio no qual tudo se faz de nada. Como sabeis, o Nada é o Absoluto. Daí por diante, nascereis pela segunda vez. Vindo do espírito, andareis o caminho da iniciação. A morte se dsvanece. Sabeis que tendes existido, e que sempre existireis. Compreendereis então o significado de Shamballah, ilha imperceptível de Som e Luz, da qual deriva a doutrina secreta do budismo: Olho e Coração, Saber e Amor, fazendo jus ao equilíbrio entre as dualidades".

13 September 2007

os Choris


Foto tirada na exposição SMETAK IMPREVISTO, ver post homônimo do dia primeiro de setembro.

Os Chorís são uma família de instrumentos semelhantes na aparência, mas diferentes no som e na simbologia. Esta foto não ficou boa, tá tudo meio tremido, mas coloquei pra dar uma idéia de como estão bonitos assim na exposição Smetak Imprevisto, penduradinhos na parede e com esta iluminação mística e solene. Na frente dos Chorís está o instrumento Baixo Mono, que consiste em uma "tábua comprida, com uma corda de piano, de registro grave. A tábua repousa sobre dois tubos de isopor, perfazendo a função de caixas acústicas. Produz um som relativamente muito longo. Com vários instrumentos deste sistema, podem ser produzidos efeitos extraordinários". E continuemos no livro de Smetak A Simbologia dos Instrumentos:

"Os Chorís existiram primeiro com a cabaça inferior, havia só uma casca de côco, uma cabaça e um pau de vassoura (O Mundo). Eu assumi, assim, a visão do nosso globo terrestre como se este fosse um ôvo, reproduzido no reino vegetal como cabaça, com uma forma ovóide. Então a primeira percepção que temos é a de que tudo isto está dentro de um campo de vibração. Mais tarde coloquei a cabaça de cima como concha acústica superior.

Quanto ao nome Chorí, nem chora, nem ri. Ele é equilibrado. Tem um som pequeno, mas muito rico de séries harmônicas, que repercutem lá em cima da cabaça. Sai às vezes um soluço maravilhoso. Tem pequenos fenômenos sonoros que outros instrumentos não possuem. É um instrumento colocado dentro de uma concha acústica (mesmo processo que nos teatros gregos), neste caso, um côco dentro de uma cabaça (o peixe entrou no aquário e salvou-se). O côco. vindo do alto, parece repousar no colo da terra, um contando ao outro a sua história.

É bom lembrar aqui o conceito milenar hindu: Fohat e Kundalini, inteligência e força criadora. Ou também outro signo já mencionado: Yin e Yang".

Abaixo tem uma foto tirada do livro, que dá uma idéia melhor dos Chorís. Da esquerda para a direita: Chorí Baixo, Chorí Microtonizado, Chorí Pagode, Chorí Sol e Lua, Chorí viola, Chorí Violino, Chorí Violoncelo, Chorí com Caixa de Ressonância. Feitos em 1968.

E agora, às descrições no livro:

Chorí com Caixa de Ressonância- feita de uma cabaça cortada pela metade, e servindo de concha acústica para a metade de um côco com tampa de pinho. As paredes de fora funcionam para segurar o instrumento nos joelhos.

Chorí Pagode- foi aplicada aqui uma caixa acústica superior, de cabaça. A espiral do som se realizou e se tornou um fator acústico, demonstrando a diferença entre a visão do oriente para o ocidente, a vertical para a horizontal. Possui um registro que permite dois sons diferentes. A diferença entre essas duas sonoridades é feita com um pedacinho de madeira- também chamado de "alma"- que liga e desliga a tampa do fundo, estabelecendo um campo fixo na tampa, embaixo do cavalete. Coloquei uma porção de cabaças, uma em cima da outra, lembrando assim os templos indianos. O Chorí Pagode é afinado em quintas.

Chorí Microtonizado- diferencia-se dos outros chorís pela ausência da cabaça superior, e foi construído sem o registro.

Chorí Sol e Lua- (Gêmeos, astrologicamente). Instrumento com duas caixas acústicas remetendo-nos à história remota da humanidade dos andróginos e, assim, à cosmogênese e antropogênese, ou seja, à divisão da humanidade em macho e fêmea, divisão dos sexos, Adão e Eva. O instrumento é de caráter estereofônico, riquíssimo em reprodução de harmônicos. As leis inerentes a este instrumento foram usadas na arquitetura das naves de catedrais, resultando-se a grande acústica do barroco. Duas cabaças, uma embaixo e outra em cima, Sol e Lua. Mas diferente da Vina que não conhecia ainda. A segunda cabaça é colocada no lugar da voluta que simboliza, geometrizada, a curva do som. Mas deixou de ter uma função sonora, é apenas ornamental e estética. E isso não é pouco, mas poucos o sabem. Este instrumento assemelha-se muito à Vina e, mais tarde, farei um instrumento para ser tocado a pizzicato, colocado nos joelhos como uma cítara, com bordões, mas o braço oco, e colocando neste mais uma cabaça, para o som circular lá dentro, vindo de baixo e dando a volta para cima, para novamente descer e subir no seu itinerário. Simbolicamente, é o signo da balança. Nesse Chorí procurei levar o som até o cavalete; isto foi mais ou menos conseguido e o som deste instrumento é muito bonito, tem uma continuação quase inaudível. O efeito é de grande suavidade. É a lua indo atrás do sol, sem nunca alcançá-lo... Possui cinco cordas e tem a mesma afinação que a "Viola Pomposa", criada por Bach. Este instrumento é muito flexível e não segura bem a afinação, balança muito. Isso justamente da um certo charme ao som.

Quarteto- é o conjunto dos Chorís Baixo, Violino, Violoncelo e Viola. É também feito com cabaças, devido à sua importância como conchas acústicas. O corpor de ressonância é feito da metade de um côco. Os braços, de cabo de vassoura. O Baixo se distigue dos demais instrumentos por se tocado em cima de uma caixa de isopor. A reprodução dos graves é excelente em relação ao pequeno corpo da caixa. Estes quatro instrumentos são a prova de que com poucos recursos podem ser feitos instrumentos baratos, de fácil manuseio. Se alguém quiser construir futuramente um instrumento com cabaças, que plante as sementes e não as jogue fora, que coloque as sementes na terra. As cordas do Quarteto são de violão, os arcos de bambú, e as crinas, de sisal. A sua afinação é em quartas e quintas.

07 September 2007

a Vina

A VINA DE FRENTE


A VINA DE COSTAS


Esta é a minha preferida, não só por sua beleza extraordinária, mas pelo que ela significa. Sublime, de frente e de costas (aliás, foi feita para ser tocada de costas para o público). Forte, imponente, profunda, impressionante. Feita de cabaças, metal, madeira, mangueira de plástico, cordão de nylon e ferro, no ano de 1969. Altura: 1.45 m, é um instrumento musical friccionado e percutido.

Selecionei uns trechos do livro de Smetak "A Simbologia dos Instrumentos", em que ele fala sobre ela. Tentei pegar mais os que falavam sobre o instrumento propriamente dito, mas foi difícil porque a doutrina (Eubiose), Smetak e os instrumentos são uma coisa só. Aqui estão:

"E renasce das plagas do extremo ocidente, no Brasil, em Salvador, a Vina Itaparicana, este misterioso instrumento milentar, no qual se acham ocultos todos os instrumentos de cordas, inclusive, pelo seu timbre, o cravo. Abre uma nova perspetiva: a escultura sonora.

Esta Vina levou nove meses para ser concluída. Depois de terminada, o autor se viu numa situação estranha: contemplar o passado e, ao mesmo tempo, o futuro da humanidade e da divindade (........) O material utilizado foi cabaças-cabeças. Quanta coisa podemos fazer com cabaças, elas servem para tantas coisas: cuias, pedir esmola, construir instrumentos. O miolo contém sementes. Então a cabaça está oculta na semente, e a inteligência está oculta, escondida, na cabeça. Spes Messis in Semine (a esperança está na semente). Lancemos uma semente e observemos, igual ao alquimista, a sua transformação em ouro mercúrio. Plantemos enfim uma árvore (.....) Temos, nas extremidades de um tubo, o braço, princípio que perdura em todos os instrumentos móveis de cordas que se dividem em duas partes: braço com cabeça (voluta), metido numa caixa de ressonância, macho e fêmea unidos para a realização de uma terceira coisa: o Verbo- o Som. Nas duas extremidades acham-se duas cabaças. Uma menor, embaixo, e uma maior, em cima, abrindo um impulso gótico de baixo para cima, ou seja, dos pés para o crânio da mente universal, e do objetivo para o subjetivo, ou vice-versa, seja então, do absoluto para o concreto (.....)

Esta Vina dever ser tocada de costas para o público, com o intuito, simbolicamente falando, da busca de fora para dentro. Mas com gesto. As antenas estão dirigidas para o fim subjetivo, e não para o objetivo. O recitante assimila o magnetismo dos presentes, para ultrapassar os limites (.....)

A cabaça simboliza a mente universal (....), e a boca é o ouvido ao mesmo tempo. Tem a sua abertura em sentido contrário, em direção ao público. O som vem de duas direções, produzido na terceira cabaça inferior. Uma parte do som circula e sobe pelo tubo e passa pela boca da segunda cabaça, a qual fica encaixada no tubo. Este funciona como ressoador. As ondas passam pela boca da segunda cabaça, o Vishnu. Lá ressoa um metabolismo, sobre pelo crânio, para enfim se espalhar pela abertura da boca da primeira cabaça. (....)

Não há nada morto no universo. Tudo é vida e vibração. Morte é apenas a transfiguração de formas velhas, que não se atualizam mais numa concepção de idéias superiores.

Este saber intelectual causará no leitor um estado de prefelicidade. Refere-se ao futuro. Ele tomará conhecimento dos acontecimentos atuais com naturalidade e sem paixão. Sem fanatismo, sentidno e sabendo que estes acontecimentos são apenas transitórios para os outros, mais decisivos ainda. Ele também é transformador, sublimador, percebe a Metástese universal, a União Total num único estado de consciência em que não há mais diálogo, mas sim monólogo. Uníssono. Chegará o grande dia: Sede Conosco. Não é esta a vida que nós vivemos, é uma outra. Esse processo entra no labor da improvisação.

Assim, esta Vina é um ser vivo. As suas cabeças são cabaças do reino vegetal da natureza. Seu miolo é constituído de sementes. Eis a grande revelação da natureza. A árvore está oculta na semente. Se a semente for má, a árvores também o será. Se a semente for boa... os frutos serão bons. O destino está nas vossas mãos. As artes são o exemplo dos vossos pensamentos, libertarão ou escravizarão (Confúcio).

Uma corda atravessa o interior do tubo, que é o braço do instrumento. Esta corda de aço liga a cabaça superior à inferior, terminando em espiral. A serpente Kundalini em plena função, despertada, impulsionando a glândula pineal. O interior da cabeça-cabaça é dourado, acentuando este mister. Esta corda vibra constantemente, porque é sujeita a todas as ondas sonoras simpáticas das outras cordas. A espiral corresponde interiormente.

O braço, exteriormente, leva mais cordas, digamos, bordões. São os chamados recursos naturais. Estes podem ser afinados "ad libitum"; são os estáticos, 30 notas estáticas, invariáveis, causais e fixas. Variáveis, apenas, são as relações e o ritmo dos acontecimentos; a mudança dos tempos, dos ciclos, das idades; o relógio do tempo, o espaço continuando a marcar o tempo.

De fato, estas cordas representam um conjunto separado, foram e ainda são cordas simpáticas. Mas agora, também bordões, sinos e harpas. São, na face da terra, uma vez os jovens, os eternos adolescentes, e a velhice ao mesmo tempo. Juventude que se anuncia pedindo os seus direitos. Juventude que anuncia uma nova tônica, exclama novas idéias coletivas. Ao seu lado, a velhice, cheia de sabedoria, cingida de uma coroa de espinhos, talvez os anéis de saturno, simbolismo que o Cristo teve de suportar. E mais afastado, Urano, o avô do Universo.

Seguem as três cordas vocais montadas em cima do braço sonoro, mutáveis, dedilhadas. As cordas tocadas pelo arco expressam uma relação do homem para com o instrumento.
E onde se dá a variação das formas e imagens psíquicas (.....)

Duas campaínhas, tocadas com anel de ferro, dentro de um espaço triangular, comunicam-se com o plano astral, junto com uma nota grave, som de gongo chinês; constam nesta antologia, fazendo a ponte de continuação para a escala dos sons inaudíveis ao homem, mas existindo mentalmente; as séries harmônicas eternamente circulantes. Transmigração da idéia, o eterno vir a ser, o servir, a encarnação dos seres e do Verbo pelas religiões.

Justificando a tese de que tudo é vida e vibração, a Vina é dotada de um sistema de vibrafone elétrico, dinamizado por uma resistência e um tubo com bocal, impulsionado pelo sopro, caso as mãos estivessem ocupadas a manejar a resistência. O instrumento é tocado a arco, pizzicato e sopro.

É evidente que o executante deve ser uma pessoa de grande cultura, de saber universal e integral, e de uma inteligência vivente. Só assim ele se identificará com a simbologia da Vina. Esta deve devolver ao homem a improvisação. O instrumento é templário, é um Templo em miniatura, e expressa uma Doutrina. Não traz consigo apenas o método de escalas, arpejos, e exercícios. A improvisação é um reflexo da existência. Esta se expressa no monólogo, na voz do silêncio (........)

A construção da Vina não é totalmente fixa. A tampa da caixa de ressonância encosta sobre feltros em cima da cabaça, permitindo, assim, maior flutuação de vibração e atuação sobre o som, libertando-o. O interior não é mais tão separado do exterior, como nos instrumentos tradicionais, ele respira. O cavalete toma forma humana, ganha dois braços, os quais seguram uma matraca comprida e variável, feita de madeira. Esta matraca, que serve de registro, produz um efeito sobre a gravidade e, em consequência, sobre o som, lembrando o Saci-Pererê que se balança na matraca.

É possível colocar a cabaça de cima em várias posições, para tomar diversas expressões na plástica sonora. Resulta daí uma estética que se expressa em diversos aspectos e torna-se menos dura, menos estática, adaptando-se a múltiplas finalidades (.....)

E aqui temina a história da Divina Vina, dedicada a um templo. Plástica-Templo sonoro. O Templo Monumento está erguido em Mar Grande, na Ilha de Itaparica, no cume de uma colina, de onde se descortina um panorama de extraordinária beleza natural. Lá se encontra um grande mistério desde os tempos de Cabral: Crivatsa-Laurenta-São Germano. Para lá se dirija o leitor amigo, que saberá e sentirá, então, mais do que pode ser anunciado. Este trabalho apresenta apenas uma das aplicações de uma doutrina, cuja tese, antítese e síntese seriam: o concreto, o abstrato e o absoluto. Os três planos da existência. Ou um nos três. Os três no Um. E muito mais que não pode ser dito aqui..."

o Bicho


A primeira Plástica Sonora de Smetak que vou editar aqui é o Bicho. Não é a mais bonita, nem a que tem o som mais incrível, mas é a que mais me comove por ser a que ele fez logo depois de me conhecer, e dedicou a mim. Isto foi em em abril de 76, quando participei de seu Curso de Criação Espontânea no MAM RJ. No final da primeira aula ele pediu pra eu cantar, fiz umas coisas que ele gostou muito, e logo ali começou a nossa ligação. De noite estreava sua peça A Caverna, e me chamou pra participar. Depois que ele voltou a Salvador, continuamos a nos corresponder fervorosamente, e em julho ele me chamou pra lá me apresentar com ele no Festival de Arte da BA. Quando cheguei, lá estava o Bicho na minha frente.

Este instrumento é eletrônico, tem captadores por todos os lados, que ampliam ruídos mecânicos e atritos. Imprevisível, requer muita virtuosidade do tocador. Tem 2 metros de altura, e várias partes que emitem ruído: a folha de flandres que se mexe parecendo tempestade, a mola que pode ser percutida com uma baqueta com movimentos rápidos ou contínuos como um recoreco eletrônico, as hastes de metal na lateral que se mexem fazendo sons de bambús metálicos irregulares e incontroláveis, uma caixinha de Pastilha Valda, que apertada lembra o som de formigas mastigando, a espiral da vida que roda produzindo também som, pratinhos metálicos, a corrente que forma o "rabo" do bicho que também é sonoro, e pode-se também usar o arco do violino, copo de vidro pra friccionar em várias partes. Enfim, uma verdadeira viagem!!!!!

E por que o nome Bicho? porque Smetak dizia que dentro da minha garganta existia um reino de animais selvagens, mitológicos, fantásticos, híbridos, bêbados, intergalácticos que precisavam ser soltos pra povoar a Terra.

Esta foto tremida dá uma idéia de como estava o meu coração: fremente, palpitante, estremescente.

01 September 2007

SMETAK IMPREVISTO


Por onde mesmo que eu descia do Campo Grande pro Unhão em 76? ni idea... Fui andando por aquelas ruas pra ver se minha memória desse um click e pudesse de repente lembrar. Todas eram familiares, poderia ser nessa, ou naquela... Largo dos Aflitos.... mmmm.... Rua Carlos Gomes... mmmm.... todo suenabame. Este viaduto..... mmmm..... o "saara"da Av. Sete.... mmmm... nesta busca labiríntica acabei chegando lá, por um caminho mais complicado, mais longo, mas cheguei. To descendo a rampa do Unhão (MAM), quando ouço uma voz me chamar, e não era vinda do além, como tudo até então parecia ser: era real, era carne e osso, era a Jasmin, a produtora do evento, que eu só conhecia por email (numa inspirada madrugada ela conseguiu me achar na rede -que maravilha que é a internet- fui encontrada mesmo tendo mudado de nome!) e logo me contactou para falar da exposição, dar depoimento etc etc.... e fomos percorrendo tudo por ali, ainda faltava muita coisa, operários pintando o lado de fora da capela, outros fixando as cabaças e as cordas no tótem SMETAK IMPREVISTO no jardim, placas sendo afixadas... perfumaria, como ela disse... Entramos na casa grande e minha boca abriu para não mais fechar: as Plásticas Sonoras estavam lindíssimas, super-conservadas, aliás mais do que quando eu tocava nelas nos anos 70... Que sensação rever estes instrumentos, era como se eu estivesse reencontrando pedaços de mim que tinham ficado pregados ali neles. Conhecia cada um tão bem... tocado em cada um tanto... lembranças de situações, cheiros, a voz dele, sua mão grande e áspera, a temperatura do ar, a fumaça de seu cigarro-seda com tabaco Trevo apertado, cola, ferrugem, pó de cupim ...

Tudo a ver a exposição ser no Solar do Unhão, que é um conjunto arquitetônico tombado pelo IPHAN, e restaurado pela Lina Bo Bardi em 69. No século XVII era um engenho de açúcar à beira-mar, do mesmo tipo dos engenhos encontrados na zona da mata (casa grande, capela, senzala).



A casa grande abriga hoje o Museu de Arte Moderna da Bahia, e a capela de Nossa Senhora da Conceição faz parte do conjunto. A OBRA -as Plásticas Sonoras de Smetak- está exposta na casa grande (casamento perfeito com aquele interior moderno, escada de madeira em espiral, divisórias curvas, iluminação indireta suave focando cada instrumento)












e na capela está O HOMEM: cabaças-vídeos (senta-se, coloca-se um fone, a cabaça no colo, e assiste-se os vídeos de filmes e depoimentos sobre Smetak)






objetos pessoais, fotos e filmezinhos caseiros projetados, e o mais impressionante de tudo: bem no meio ao fundo, a réplica de O OVO, um estúdio de acústica perfeita que ele projetou (originalmente seria de 22 m de altura, este tinha só 5).

Fiquei muito emocionada, lágrimas nos olhos quando vi aquele Ovo na minha frente: quantas vezes ele tinha me falado deste projeto, sem nenhuma esperança de vê-lo realizado e agora, lá estava o seu sonho materializado na minha frente. Era que nem ver um OVNI!!! Como ele ficaria feliz, se pudesse ter vivido pra ver... Entrei no Ovo com a Jasmin e Milton e cantei. O som saía tão puro, tão amplificado, tão corpulento, e num determinado ponto ouvia-se toda uma gama de harmônicos, como se tivesse mais do que uma voz num uníssino perfeito. Foi uma experiência inesquecível. Depois a TV Bahia me filmou fazendo uma improvisação de noite.

Ficamos lá até de tarde, saí pra comer, me refazer pra inauguração às 19:30.

Quanta gente, acho que havia umas 3 mil pessoas... reencontrei os filhos Uibitú e Honorato, com suas famílias. Uibitú tinha 5 anos, me lembro dele sentado no meu colo. Agora quem sentava era a Amanda, também de 5 anos, a sua filha com a Olga (restauradora dos instrumentos e artista plástica incrível que faz bonecos manipulados de todos os tamanhos esculpidos em madeira). Teve uma apresentação em frente ao Ovo do Uibitú- violino- e seu conjunto de cordas: Smetak, Bach e Vivaldi. Conversei muito com o Honorato, que me pos a par de como estavam as coisas depois destes anos todos, e conheci seus filhos Ícaro -violino-e Érica -flauta. E ficamos todos de nos encontrar durante a semana, o que de fato aconteceu, com muita alegria e carinho.

Quando na alta madrugada voltei ao hotel, não senti insônia. Larguei o corpo exausto na cama, a mente parou de pensar, o coração parou de sentir, o fígado tratou de filtrar a somatização do emocional. Não sonhei, porque sonho era o que eu estava vivendo. Apaguei.

Final do segundo relato. Na próxima, virão elas. As Plásticas Sonoras.