11 April 2010

adeus, semínima minha



Semínima estava com hipertireoidismo -entre outras coisas mais banais- tomando remédio humano... há um ano e meio ficamos tentando equilibrar estas taxas, com muito sucesso... mas o medicamento era tóxico, já havia atacado seu fígado uma vez... enfim... tudo meio bambo... volta e meia eu levava pra exame de sangue... emagrecia... recuperava um tiquinho... vomitava... melhorava... e agora de repente esta diarréia escura... esta falta total de apetite... tres dias e noites sem comer...

Uma pluminha ao léu. Uma velinha que se apagou. Um anjinho que recebeu o chamado da deusa egípcia Bastet e foi encontrar-se com ela. Mas não consigo ainda me conformar.

Será que estaria viva ainda se eu não a tivesse levado pra internar? tentei em casa, fiquei dando água de arroz e água de côco na seringa pra hidratar e alimentar, mas seria isto o suficiente? e por quanto tempo? E se ela morresse em casa? daí eu ficaria com culpa de não ter tentado salvá-la, tentado reverter a situação, tentado alguma coisa... tentado pelo menos. Quem sabe, ela poderia ter escapado de mais essa? pularia do barco do Caronte?

Não pulou.

Fomos enterrá-la no quintal. Tudo muito úmido da tempestade assassina de dois dias atrás. A folhagem toda verde vibrante brilhante, a terra molhada. Fresquinha. Cheia de vida. Cores fortes. Pulsante. E ela ali, inerte, que contraste da porra!!! Não tive coragem de olhar. Fiquei abraçada com a caixinha, sentindo seu peso-pluma no meu colo, mas não mais o seu calor. Conversando com ela, enquanto Milton cavava. Depois, ele cortou 2 lindas folhas de costela-de-adão gigantes, uma pra deitar seu corpinho, outra pra cobri-la antes de jogar a terra e colocar as pedras. Nesta hora, olhei pro céu.

Enterramos minha preta ao lado de Ismael e Mia. Enfeitei o seu túmulo com flores do jardim, plantei uma AMOReira e umas maria-sem-vergonhas em volta. Fiquei ali com ela, cantei a sua música (letra em cima da melodia de Frenezi):

eu amo tanto a Semínima
adoro tanto a Semínima
preciso tanto da Semínima
Sema semá minimá
minimá minimá

Adeus, minha preta mais linda, minha gata mais adorada, minha amiga, meu coração.

semínima



Morreu Semínima, minha gata preta, minha nota preta musical, de nariz preto lustroso, nariguda de olho preto que me olhava, e quando me encarava, ia lá pro fundo da minha alma. Morreu a minha amada gata, a que não podia morrer e me deixar deste jeito.

A que me buscava no portão todos os dias, na chuva, no sol, de noite ou de dia. Aí eu pegava-a no colo e ia subindo com ela até a varanda.

A que eu escovava por ser a mais peluda e que no ano passado teve que ter a barriga tosada, tadinha, de tantos dread-locks duros que haviam se formado. Porque no inverno ela adotava um casacão de pelo, com um boá em volta do pescoço, e aquilo tudo caía no verão e ela ficava magrinha.

A que eu deixava entrar e ficar em casa mais que os outros, a que eu dava quitutes especiais.

A que bastava eu chamar uma vez só, e lá vinha ela correndo se sacudindo toda, toda rebolativa, quer onde estivesse. Eu adorava.

A que ficava no meu colo, enquanto eu estava no computador. Meio inquieta, é verdade, porque o que ela queria mesmo era uns tiragostos. Mas ficava lá comigo.

A que era boa-boca, sempre disposta a encarar um “bom prato”. Na ceia noturna que eu dou pros gatos todos lá fora de noite, ela ficava até o final lambendo as minúsculas partículas que sobravam dos outros. Destestava um disperdício...

A que quando pariu, pariu logo seis, e gritando que nem gente. Nenhuma gata minha havia tido esta reação, todas pariam em silêncio. Nem consegui ficar ali. Fiquei muito nervosa, mas foi tudo bem.

A que gostava de dormir num banco alto, ao lado do fogão, deixando a cabeça pender até perder o equilíbrio e cair. Aquilo me dava uma aflição... sei lá... podia quebrar o pescoço...

A que eu pronunciava seu nome, e ela me respondia. Quantas vezes eu quisesse. Semínima -miau, semínima -miau, semínima -miau.

A que eu dava comprimido enfiando o dedo na sua boca, sem o menor medo, porque ela jamais iria me morder.

A que nunca brigou com outro gato. Semínima não tinha inimigos. Porque sempre tem umas inimizades num coletivo de gatos. Um rosna pro outro, estranha, dá umas patadas, mesmo os que são da mesma família. Tenho duas gatas, as mais novinhas, irmãs da mesma barrigada. Cresceram juntas a vida toda, uma mora em casa- a Aracy- a outra no quintal- Chiquinha, mas quando as duas se encontram, é um tal de dar patada uma na outra, rosnando... Aracy com Piteca, Fumaça com Aracy, Aracy com Colombina, Ping-Ling com todos... Pois Semínima era uma gata que nunca se indispos com outro, nunca. Mais que isto: tinha uns afetos sinceros, uns amigos do peito: por exemplo com a Colombina. Era um tal de lambe-lambe as duas se lambendo, tia e sobrinha, precisava ver. E também com Ismael, seu melhor amigo, viviam dormindo juntos, encaixadinhos, fazendo companhia um pro outro, até o final da vida dele.

Semínima, meu amorzinho, que saudade sinto de você, minha preta.