28 March 2008

Cachao


Morreu no dia 22 deste mes e deste ano, agora no sábado, um músico pelo qual sou apaixonada:Cachao. E foi como se fosse um tio distante, me era tão familiar...Como tocávamos sua música por uma época aqui em casa (assim que o descobrimos), era todos os dias e o dia inteiro, cada um que chegava aqui era apresentado a este baixista, arranjador, maestro, compositor tão extraordinário.

Cachao foi quem mais revolucionou a música cubana, se apresentando e compondo com seu irmão Orestes Lopes dos 30 aos 50 em Havana. Sua grande idéia foi acrescentar ritmos africanos à música cubana, criando o "danzón" que viria a se tornar o mambo. E este rítmo atravessou o mar em direção ao mundo, revolucionando também a música internacional, em especial a americana, nas linhas de baixo do R&B, nos improvisos jazzísticos à la afro-cubana, que depois deram filhotes: a salsa e o latin jazz.

Nasceu em 1918 numa família em que cerca de quarenta integrantes eram músicos, a maioria baixistas. Começou na música tocando bongô aos 8 anos. Aos 9, já no baixo, tocava em cinemas mudo de sua cidade, acompanhado pelo genial pianista também cubano Bola de Nieve (Ignacio Villa). Aos 13 já tocava contrabaixo na Orquestra Filarmônica de La Habana, e foi regido por maestros como Villa-Lobos, Stravinsky e Herber von Karajan. . Ele se transferiu no começo dos 60 pros EUA, e logo se tornou um dos baixistas mais famosos e requisitados em NY. Tocou com dezenas de artistas, dentre eles a Celia Cruz, Tito Puente, Paquito de Rivera, e fez a trilha de vários filmes americanos. Morreu dia 22 de março deste ano, em Coral Gables, Florida. Queria era colocar áudio dele aqui pra iluminar a página, mas não sei ainda fazer, aliás, nem sei se dá pra fazer. Cachao Cachao, obrigada pelas centenas de horas de puro prazer e requebradas de cadeiras, ombros, mãos e pés!!!!

20 March 2008

ultimo bolo de papoula


"Anos" sem escrever aqui. Tá todo mundo preocupado comigo. Ficou doente? viajou? tendinite? teu mac pifou? encheu o saco? sem inspiração? sem assunto? a porca torceu o rabo? rolou um bate-fundo?

Nada disso. Sabe quando cê acorda de manhã com uma lista de coisas pra fazer, e no final da noite só conseguiu fazer um terço? sabe quando ce fica com uma sensação que tá sempre atrasada nos compromissos, e vive correndo olhando pro relógio pra não tardar e escrevendo notas pra não se esquecer ? pois é, passei uma época assim. Nem aquarelar, aquarelei... Não virei empresária nem executivo nem administradora, necas. Minha vida normal mesmo. É que atravancou um pouco de tudo, um engarrafamento de coisas que estavam sendo empurradas com a barriga tiveram que ser resolvidas, porque não dava mais (na verdade sempre vão ter coisas inacabadas, mas... c'est la vie...), e... bem. Chega de me desculpar. A verdade é que sinto muita falta de escrever, agora recomeço este blog com toda a alegria. Difícil vai ser escolher o assunto, já que tem taaaaaantos acumulados enquanto eu vivia este hiato...

Me lembrei de uma frase do Oscar Wilde, que é mais ou menos assim: me dê o supérfluo que dispensarei o necessário. Vou começar com um assunto que pode parecer bobagem, mas é revoltante pra mim (e pra quem trabalha ou come ISTO). Proibiram a venda de sementes de papoula. Uma ignorância total. Tenho vergonha de morar num país que proibe a venda de sementes de papoula, pois elas sempre fizeram parte da culinária em todo mundo, e estão em todas as prateleiras de supermercados de outros países. Por que isto?

Fui tratada como traficante fora-da-lei quando pedi 300 gramas nas muitas lojas em que há anos costumava comprar, no Saara. Compro isto há aaaaaaaaaanos. Uma das minhas especialidades culinárias é um bolo de sementes de papoula, receita tradicional de minha mãe (ela era de família russa, mas o bolo era húngaro... ela dizia que russo e húngaro era a mesma coisa!!!! ela sabia que não era, mas entendo o que ela queria dizer). Aliás, já tinha acontecido uma proibição destas há um ou dois anos atrás, mas tinham voltado a vender. Há 20 anos era baratinho, depois dobrou de preço, e no natal passado, triplicou. Mas podia ser encontrado. Bel chegou a fazer seus biscoitinhos natalinos, Simone seu pãozinho e eu, meus bolinhos. Tudo na santa paz. Agora os vendedores me olham com um ar de superioridade e dizem: FOI PROIBIDO. Tento conversar racionalmente com eles, mas me olham de cima, e como se eu fosse um elemento altamente suspeito, bradam pra encerrar o papo: AGORA É PRA VALER!!!!

Caramba, mas é muita ignorância. O pior é que não tem uma explicação real pra isso. Ou será que eles acham que é alucinógeno, e que a gente vai ficar doidão? PERALÁ!!!! sim, o ópio é feito com a flor da papoula, a heroína com o ópio, mas a fabricação é sofisticadíssima e exige uma série de exigências para que possa ter sucesso. Não é assim. Sou fabricante de bolo e não de ópio, será que não dá pra ver a diferença?

É no sul do Afganistão que se concentra 90 % da produção mundial do cultivo da papoula. Lendo um pouco sobre esta linda flor, achei um site (http://www.jardimdeflores.com.br) que fala sobre ela. Quem escreve é Rose Aielo Blanco. Aí vai:

A papoula foi muito conhecida nos tempos remotos, tinha muito prestígio entre os médicos da Grécia antiga. Na mitologia grega era relacionada a Hipnos, o deus do sono, pai de Morpheu - que a tinha como planta favorita e, por isso, era representado com os frutos desta planta na mão. Há também uma estreita relação entre a papoula e a deusa grega Nix, a Noite. Deusa das Trevas, filha do Caos, é na verdade a mais antiga das divindades. Freqüentemente, ela é representada coroada de papoulas e envolta num grande manto negro e estrelado. Em muitas referências ela se localiza no Tártaro, entre o Sono e a Morte, seus dois filhos. Os romanos não a representavam em um carro, mas sempre adormecida.

A papoula é conhecida há mais de 5 mil anos - os sumérios já a utilizavam para combater problemas. Os antigos comiam a flor inteira ou a maceravam para obter o sumo. Na Mesopotâmia, curavam-se doenças como insônia e constipação intestinal com infusões obtidas a partir da papoula. Mais tarde, os assírios e depois os babilônios herdaram a arte de extrair o suco leitoso dos frutos para fazer remédios.

Hipócrates foi um dos primeiros a descrever seus efeitos medicinais contra diversas enfermidades. Há quem defenda que mais tarde, um médico grego em Roma, padronizou a preparação do ópio com uma fórmula (o mitridato) e a receitava aos gladiadores. O uso do ópio difundiu-se pela Europa no início do século XVI, mas sofreu forte combate quando a Igreja Católica começou a controlar os remédios. Foi por essa época que Paracelso, o famoso médico e alquimista suíço, elaborou um concentrado de suco de papoula - o láudano, que teria o poder de curar muitas doenças e até de rejuvenescer. A disseminação desta crença levou à popularização do seu uso em todo o mundo ocidental. Com o tempo e com a expansão das rotas comerciais, o ópio acabou por se tornar uma droga universal.

A papoula é uma planta da Família das Papaveráceas, também conhecida como dormideira. É uma herbácea anual que apresenta propriedades alimentares, oleaginosas e medicinais. A planta apresenta um caule alto e ramificado, com folhas sésseis e ovaladas. As flores são grandes, brancas, rosas, violáceas ou vermelhas, e o fruto é uma cápsula. Por toda a planta circula um látex branco. Todas as partes da papoula são consideradas venenosas, com exceção das sementes maduras.

O ópio é retirado a partir do látex encontrado nas cápsulas que não atingiram a maturação. Ao se fazer cortes na cápsula da papoula, quando ainda verde, obtém-se um suco leitoso, o ópio (em grego, refere-se a suco), que contém cerca de 25 alcalóides - o mais importante deles é a morfina, presente em até 20% no ópio.

Os nomes relacionados à papoula são bem sugestivos O nome científico da planta "somniferum" (relacionado a sono) e a origem do nome "morfina" (relacionada ao deus da mitologia grega Morfeu, o deus dos sonhos) nos levam a compreender os efeitos que o ópio e a morfina podem produzir: são depressores do sistema nervoso central. Além disso, o ópio ainda contém outras substâncias, como a codeína, e é dele também que se obtém a heroína, uma substância semi-sintética, resultado de uma modificação química na fórmula da morfina.

Ficha da Planta:

Papoula
Nome científico: Papaver somniferum
Família: Papaveráceas
Origem: Ásia
Floração: verão
Propagação: por sementes
Mistura de solo ideal para cultivo: rica em matéria orgânica, pode-se usar uma mistura de 1 parte de terra comum de jardim, 1 parte de terra vegetal e 2 partes de composto orgânico
Luminosidade: precisa de muita luz, o ideal é que receba luz solar direta apenas nos horários mais amenos do dia (pela manhã ou à tarde)
Clima ideal: ameno
Regas: deve ser regada regularmente, mas o solo não deve nunca ficar encharcado.

Nunca pensei na vida em plantar papoulas, mas depois que não encontrei mais as sementes pro meu bolo, peguei cinco que tinham sobrado num vidro (elas são mínimas, quase uma poeirinha), e pus na terra (tá vendo? isso é que dá proibir!!!!!)

Não nasceu nada... sementes velhas já não servem nem pra comer, quanto mais pra plantar... agora vou ter que inventar outro sabor...

A foto é do último bolo de sementes de papoula que fiz agora no dia 10 de março. As florzinhas são da arvorezinha no nosso jardim. Fica aqui registrado, na esperança de que, algum dia num futuro nem tão futuro assim, alguém possa reverter esta lei idiota! e que nós cozinheiros possamos de novo rechear nossos quitutes com as inocentes sementinhas pretinhas e crocantes, que tanto alegram o nosso viver...